segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Matadouro


Enquanto os posts sobre a viagem para a Tailândia não ficam prontos (sim, serão mais de dois) vou contar a experiência surreal que passei no último final de semana (04/02/2012).

Existe as seguintes opções para comprar carne aqui no Timor Leste: supermercados (carnes australianas e neozelandesas) e feiras que são as carnes de vacas/bois/karaus abatidas por aqui. E lógico que este último é mais barato. Ah e esqueça a picanha, o contra-filé, alcatra, cupim (DESESPERO) etc. Elas até existem, mas está no meio de algum outro pedaço dos cortes australianos. Mas até que se consegue carnes boas por um preço salgado. Ex: dois bifes grossos por $6. E agora que estou almoçando em casa não dá pra comer carne a vontade. A não ser frango. Tenho comprado 4 coxas de frango por $1.4.

Então, no meio da semana passada o Junior Sem Acento manda um e-mail para mim e para o Carlos com um pdf em anexo com os desenhos dos cortes australianos e dos brasileiros juntos. PQP. Vamos comprar carne (lá no matadouro) de boi e com o corte pelo menos parecido com o que somos acostumados já que temos o pdf e vamos pedir para cortar do jeito que queremos. FESTA. CHURRASCO. Aham, senta lá Cláudia.

É, primeiro temos que acordar as 3:40 da madrugada de sábado. Isso depois de tomar cerveja até 1:30 da madrugada. Nos encontramos todos na casa do Carlos e vamos. Chegamos por volta das 4:30. Estrutura? Pra que? É tipo um galpão pequeno, construído com cimento, mas esse já não existia, só sobrava os ferrolhos das pilastras e as escoras de madeira. Olhava para aquilo e esperava que caísse a qualquer momento.

Assim que nos aproximamos um fedor. Mas pensa num fedor de chiqueiro com carniça? Pois é. Como aqui não tem rede de esgoto e este ou é a céu aberto nas valas ou é fossa séptica, e o matadouro não tem estrutura, o sangue é jogado na vala. Os restos devem ser jogados ali por perto mesmo, já que cachorros e porcos também ficam rondando.

Perguntamos ao mao (rapaz em tétum) que horas vai começar o abate. Ele diz que daqui uns 30 minutos. E volta a lavar o chão com uma bacia e com a água de um tonel. Ah sim, já falei que aqui também não tem água encanada né :(. O chão que ele lava é um pequeno quadrado de cimento queimado de 3x3 metros aproximadamente. Ao lado, onde estão os karaus e os bois, é de chão batido. E estes ficam ali amarrados e comendo capim e vendo tudo.

Os minutos passam e começam a chegar mais homens, cada um com sua faca. Aí um papo de você é brasileiro. Ronaldo pra cá. Kaka pra lá. E assim caminha a humanidade. Depois de chegar uns 4 eles começam os trabalhos. Um deles deita no monte de capim e os outros amarram e puxam um karau novo magro (tipo um bezerro quase boi) para a área do cimento. Amarram o focinho dele no chão, uma pata traseira numa das pilastras(?) e outro fica segurando uma pata dianteira com uma corda. Isso tudo para ele não se mexer.

Eu lá esperando eles aparecerem com um machado ou uma espingarda (que é o jeito que já vi matar boi). Que nada. Uma faca normal (só que muito afiada) na garganta do bicho e pronto. Morre degolado e esgotado. Esse foi o primeiro. Filmei.

Depois do susto. Vou fumar um cigarro. Juntando a cena com o mau cheiro meu estômago embrulha. Uma respirada mais funda e estou pronto pra outra. Arrastam o karau já morto (de vez em quando ainda dava uma tremida ou uma esticada) para um canto. Jogam mais um pouco de água pra tirar o sangue e já trazem o segundo. A cena se repete. Este eu não filmo.

Aí partem para o terceiro, que depois descobrimos ser terceira. Consigo filmar. Tudo bem que foi a câmera do iphone e ela, a noite, é a mesma coisa que nada né.

Começam a abrir para descarnar. Primeira providência é arrancar as patas e depois os testículos e pênis dos machos. A gente ali olhando. Todo mundo trabalhando. Chega um casal e um senhor para comprar carne também.

Vão cortando os pedaços de carne (não obedecendo nenhum tipo de corte específico) e os pedaços tirados vão sendo jogado ali do lado, no chão mesmo. Arrasta pra cá. Chuta pra lá (as carnes). Decidimos ir olhar mais de perto pra ver se conseguimos identificar algo conhecido. Nada. Só pedaços de carne a esmo.

De repente uma água começa a sair do bucho da karau. Pensamos: 'vixe, furou a bexiga. Esta carne não vai prestar'. É, antes fosse isso. Neste momento o mao abre de vez aquela bolsa grande e sai um feto de karau. Bem formado mas ainda muito pequeno. Aí meu amigo eu já tinha perdido as esperanças.

Pegamos um pedaço de carne lá que parecia mais bonito e vamos embora. Passamos na padaria (até agora a única que sei que funciona de madrugada, já procurei outras e aqui perto de casa tem uma que abre depois das 8:00 o.O ). Compramos um pão timorense quentinho. E pensa num pão bom.

Brincamos que íamos ficar uma semana só na sopa depois de ver a cena e tal. Voltamos cada um pra sua casa e vamos dormir. Acordo ao meio-dia. Mais a tarde vamos pra casa do Carlos cortar, limpar e separar a carne (lógico que isso tudo acompanhado de uma bintang gelada). Enquanto a Giselle e o Junior vão limpando a carne a gente vai conversando e bebendo. De 15kg comprados sobraram 10kg depois de limpar.

Fritam um pedaço. A carne tem um gosto forte e é dura. Cozinham um pedaço. Continua dura. Não sei se pela cena que presenciei mas não gostei de seu gosto forte. Enfim, desisto de ficar com a minha parte.

Ah, o kg saiu por $6. Mas acho que não compensa acordar de madrugada. Se fosse um boi, com uma picanha, cupim, contra-filé e costela eu iria fácil. Mas o karau é uma mistura (eu acho) de boi com búfalo, pouquíssima gordura e gosto forte.

Ah sim, passei o domingo e a segunda com um diarréia muito forte. Mas não imagino que seja a carne, já que foi só eu. O mais provável causador dessa diarréia é a bintang que foi meio exagerada.

E vamos ter fé (na minha memória) para acabar de escrever os posts sobre a viagem para a Tailândia (Bangkok e Phuket) e pra Indonésia (Bali).

4 comentários:

  1. Cara ...

    Coragem einh... eu gastaria facil os $6 para comprar carne de verdade ou ficar no frango

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  2. Putz, se dependesse de todo esse processo sempre que eu quisesse comer carne, acho que eu ia sentir falta de proteína, porque não ia conseguir encarar sempre.

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    1. hehehe, ainda bem que tem os cortes australianos, pois se dependesse disso seria foda mesmo rsrs

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